É fato reconhecido por todos que atuam em pesquisa clínica que o recrutamento de participantes de pesquisa clínica é um dos fatores determinantes do sucesso ou fracasso de um estudo clínico. Pesquisas demonstraram que um pouco mais da metade dos estudos avaliados conseguiram atingir sua meta de recrutamento e que muitos precisaram de uma extensão no prazo e investimento.

As consequências vão além do aumento do custo do estudo pela extensão de prazo ou inclusão de outros centros de pesquisa. Existem cálculos que demonstram que o atraso de 1 mês no lançamento de um medicamento com previsão de faturamento de US $100 Milhões por ano, significa aproximadamente US $12 Milhões a menos na margem de lucro final daquele produto, já que a data de encerramento de seu ciclo de vida já é fixada pelo mercado.

Para agravar o cenário, os estudos estão demandando cada vez mais participantes de pesquisa clínica e com critérios mais restritivos, aumentando então a concorrência pelos voluntários entre os patrocinadores.

Boa parte das estratégias de recrutamento buscam os participantes entre os pacientes que possuem uma relação com o centro de pesquisa clínica ou médicos referenciadores. Estas estratégias geralmente são fundamentais porém nem sempre suficientes, sendo necessário buscar voluntários fora desta rede, através de anúncios em rádios, jornais e mais recentemente internet.

A internet apresenta claras oportunidades para se tornar cada vez mais relevante como uma das estratégias de recrutamento de participantes de pesquisa clínica.

  • Somente no Brasil, existem mais de 120 milhões de usuários, sendo que destes, aproximadamente 100 milhões tem uma conta no Facebook.
  • A internet se tornou uma fonte de informações médicas para a população leiga, tornando mais fácil identificar os interesses dos usuários por determinadas condições médicas
  • As ferramentas de marketing digital desenvolveram algoritmos muito poderosos que permitem encontrar o usuário com o perfil ideal

Na teoria parece ótimo mas e na prática, está funcionando? Para responder a esta pergunta eu procurei (na internet é claro) artigos sobre o tema e reuni alguns para comentar.

1.  O Papel da Mídia Social no Recrutamento de Participantes de Pesquisa Clínica na gravidez.

Neste estudo o autor coloca que o recrutamento de participantes de pesquisa clínica em período gestacional é ainda mais desafiador pois existe uma percepção de risco bem maior do que o real. O estudo comparou a taxa mensal de recrutamento da Fase I do estudo, onde somente as estratégias tradicionais foram utilizadas, com a da Fase II, quando anúncios nas mídias sociais foram acrescentados a estratégia. O resultado foi uma taxa de 0,62 recrutamentos por mês na Fase I contra 7,5 recrutamentos por mês na Fase II, uma taxa 12 vezes maior. Este aumento expressivo também foi influenciado por uma aumento dos esforços nas estratégias tradicionais, porém o estudo demonstrou estatisticamente que  a utilização das mídias sociais teve grande influência no resultado.

2. Utilização das mídias sociais online no recrutamento de participantes HIV soro-positivos.

Neste estudo os pesquisadores utilizaram anúncios no Facebook, uma página do Facebook, Twitter e Linkedin para divulgar uma pesquisa que foi realizada pela internet utilizando uma ferramenta de coleta de dados. Em 4 meses a pesquisa atingiu 2034 clicks, dos quais 1404 eram elegíveis a participar. O custo foi de US $3.56 por pesquisa iniciada. Dos métodos utilizados, o que se mostrou estatisticamente relevante foi o anúncio no Facebook.

3. O uso do Facebook no recrutamento de participantes de pesquisas em saúde: Uma revisão sistemática.

Os autores fizeram uma revisão de 35 artigos que utilizaram o Facebook como estratégia de divulgação para recrutamento de seus estudos e analisaram os resultados. A conclusão é que a estratégia se mostrou bem mais eficiente do ponto de vista de custo, velocidade e assertividade que outras formas de divulgação como jornal, e-mail, radio, impressos, etc.

4. O uso da publicidade no Facebook para recrutar pessoas idosas e saudáveis para um estudo clínico.

O estudo utilizou a publicidade no Facebook para recrutar pessoas acima de 60 anos de idade a participar de um estudo Fase I em que ficariam internadas por um período de 10 dias. O anúncio convidava as pessoas a preencherem um formulário ou a contatar uma CRO. Vale observar que este estudo oferecia uma compensação financeira.

Em um período de 8 semanas, 868 pessoas consultaram sobre o estudo, 621 responderam ao anúncio e 45 foram recrutadas. Anteriormente, utilizando os métodos tradicionais apenas 178 pessoas consultaram sobre o anúncio em um período de 11 semanas, mostrando uma evidente vantagem do uso de anúncios no Facebook.

Com base nos nossos resultados e dos artigos que apresentei fica claro que a internet é sem dúvida mais uma alternativa a ser utilizada no recrutamento de voluntários para a pesquisa clínica. 

Porém, dependendo de como a estratégia for implementada, pode ser apenas dinheiro jogado fora. Anunciar na internet não é apenas criar um anúncio bonitinho, colocar o telefone de contato e virar as costas. Existem diversos cuidados e ações que devem ser tomados durante todo o processo, desde o anúncio até a randomização que impactam no sucesso da estratégia.

Medidas como gestão do tráfego, uma página de captação de alta conversão, tempo de retorno para o voluntário, segurança e privacidade das informações, redução dos custos improdutivos e outras que posso me aprofundar em um outro post.


Se implementada e gerenciada  corretamente, o uso da internet para o recrutamento de participantes deve sempre ser adotada, em maior ou menor grau, como uma estratégia de curto mas também de longo prazo, onde os resultados serão crescentes.

Por último vale mencionar que quanto mais estudos clínicos forem divulgados na internet e redes sociais, mais difundida será a pesquisa clínica entre a população, assim, ao mesmo tempo que alguns estudos competirão entre si, também estarão colaborando uns com os outros, levando a um efeito bola de neve positivo em que mais estudos atraem mais pessoas que atraem mais estudos para o Brasil.